domingo, 26 de janeiro de 2014

Distrações

 
Um dos filmes mais marcantes do ano passado foi o “Mestres de Ilusão”, onde encontramos uma frase que é uma das máximas da ilusão – quanto mais perto estás, menos vez. É assim na magia e é assim na política.
 
A concentração intensa numa determinada tarefa retira ao nosso cérebro a devida atenção ao que nos rodeia. Christopher Chabris e Daniel Simons demonstraram isso muito bem com a experiência do Gorila. Duas equipas de jogadores de basquete trocam passes entre si. Uma equipa de equipamento branco e uma de equipamento preto. Os espetadores são instruídos a contar o número de passes efetuados por uma das equipas, e ignorar a outra á medida que ambas se vão misturando numa coreografia de passes. A atenção exigida aos espetadores e a instrução de ignorar algo é absorvente de toda a sua atenção. A meio do vídeo aparece por breves segundos um gorila que pára no meio, bate no peito e sai de cena do lado contrário ao que entrou. Não mais de 9 segundos.
 
Grande parte das pessoas que assiste ao vídeo não só não se apercebem da presença do macaco, como lhes custa a aceitar que não se tenham apercebido de um facto tão marcante. Dois factos que definem a nossa mente: não só podemos ser cegos ao óbvio como também somos cegos à nossa própria cegueira.
 
Passos Coelho usou a candidatura à Presidência da República que sabia que associariam ao Marcelo Rebelo de Sousa com um propósito claro distrair as atenções. A vergonha que se passou na nossa Assembleia da República nada mais foi que a aplicação clara deste princípio …..  um grande truque de ilusão ….. e conseguiu.
 
A história do pseudo-referendo é um compêndio da realidade política, ética e de cidadania dos nossos dias: um tema polémico trazido por um partido que não no governo é para matar; os deputados faltam demais e os partidos são por isso muitas vezes apanhados com as calças na mão; a presidente da Assembleia Assunção Esteves não é uma agente de conciliação e garante da democracia mas sim maquiavelicamente uma manipuladora dos seus interesses, ou do partido; um objeto como o referendo que tem um custo brutal pode ser definido por um único partido e usado no seu interesse e não no da nação; os boys como os jotas fazem os que lhe mandam para um dia virem a ter jobs; os deputados são carneiros obedientes, mesmo que em consciência sejam contra ….. e se é sobre isto é sobre tudo …..
 
Por momentos deixou de se falar na vergonha que é a Assembleia da República, órgão de soberania que deveria defender os cidadãos do país ….. que nos deveria defender a nós.
 
The closer you look ….. the less you see
 


quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Rábula – Savana

 
Todos os dias de manhã o sol nasce na savana africada. Quando a gazela acorda, sabe que tem de correr mais que o leão mais rápido ou será comida. Quando o leão acorda, sabe que tem de correr mais que a gazela mais lenta senão morrerá à fome. Moral da história: não interessa se és leão ou gazela. Quando o sol nasce, é bom que comeces a correr.


sábado, 18 de janeiro de 2014

Panteão Nacional

 
Embora o título seja um dos nossos monumentos nacionais, porventura o mais falado e comentado nas últimas semanas, este texto não é sobre o monumento em si ou se o Eusébio devia ou não ir para lá. A minha dúvida existencial é sobre critérios ….. quais os critérios para ir para lá?
 
Esta semana como seria de esperar o nosso Parlamento decidiu votar de acordo com “a voz do povo”. Como seria de esperar face ao movimento cívico amplamente difundido pela comunicação social, os nossos políticos limitaram-se a seguir o populismo de “ir com a corrente”, ou mais concretamente, não ficarem vistos como aqueles que votaram contra. Independentemente de concordarem ou não, acho que nenhum poderia para seu futuro político votar de outra forma. O “peso” e o carinho dos Portugueses não permitiam que fosse de outra forma.
 
O que não se ouviu falar foi sobre quais os critérios que levam alguém a poder fazer parte de tão famoso monumento. Lá encontramos acima de tudo antigos presidentes e escritores, porém, não temos por exemplo nenhum dos nossos prémios Nobel. O que leva então a que sejam consideradas estas figuras e não outras com feitos dignos de realce e distinção?
 
Estabelecer critérios torna-se fundamental para clarificar e apoiar as decisões. Quando existem regras ou critérios, todos sabem com o que podem contar, como devem “jogar” ou o que podem ambicionar. Se quando os critérios são os apropriados, nomeadamente nas empresas, os resultados são sempre melhores, potenciando a criação de valor ou a excelência dos resultados. Quando isso não acontece, o clientelismos ou interesses desviantes produzem resultados desastrosos. É muitas vezes a opção entre a ordem e o caos.
 
Voltando entretanto ao Panteão e aos critérios inexistentes ou não comunicados. Como alguém me dizia recentemente, se fosse apenas por levar o nome de Portugal além fronteiras, devíamos desde já guardar lugar para o Cristiano Ronaldo, para o Carlos Lopes e para a Rosa Mota ….. ou seja, desportistas. Se formos por este princípio, e na linha de quem lá está, teremos de considerar o Mário Soares, o Durão Barroso e o António Guterres. Onde definir a fronteira?
 
Já que estamos a falar da ida para tal monumento, algumas notas sobre o mesmo. Para além da beleza arquitetónica do edifício, do que mais se tem falado é do relevo que é dado a algumas personalidades, algumas delas os seus restos mortais encontram-se lá, outras nem por isso. Entre estes últimos, vamos encontrar Camões, Vasco da Gama, D. Nuno Álvares Pereira, Pedro Álvares Cabral, Afonso de Albuquerque e o Infante D. Henrique. Destas figuras podemos vislumbrar cenotáfios (ou seja, monumentos fúnebres sem a presença dos restos mortais).
 
Entre os que para além da referência efetivamente repousam lá, vamos encontrar antigos presidentes (Manuel de Arriaga, Óscar Carmona, Sidónio Pais e Teófilo Braga), escritores (Almeida Garrett, Guerra Junqueiro, João de Deus e a última aquisição Aquilino Ribeiro), sendo os wild card a Amália Rodrigues e o Humberto Delgado.
 
Qual o critério que distingue estes dos demais Portugueses de relevo na nossa história? Porquê estes e porque não outros?
 
Uma curiosidade. O tumulo mais visitado encontra-se em más condições, num cemitério em França mas quem lá está não é nenhuma figura da sua história. O túmulo mais visitado do mundo pertence a Jim Morrison.
 


quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

É fogo que arde sem se ver

Amor é fogo que arde sem se ver;
 É ferida que dói e não se sente;
 É um contentamento descontente;
 É dor que desatina sem doer;
 
É um não querer mais que bem querer;
 É solitário andar por entre a gente;
 É nunca contentar-se de contente;
 É cuidar que se ganha em se perder;
 
É querer estar preso por vontade;
 É servir a quem vence, o vencedor;
 É ter com quem nos mata lealdade.
 
Mas como causar pode seu favor
 Nos corações humanos amizade,
 Se tão contrário a si é o mesmo Amor?
 
Luís de Camões
 
 
Certas pequenos nadas do nosso dia a dia “ardem-nos” internamente sem sabermos muito bem o porquê ….. ou ás vezes sabemos e apenas depois de vários eventos o percebemos ….. e essas são as alturas em que damos razão ao texto “um Homem não é um rochedo” ….. e precisamos de um porto seguro ……….. mas a vida é o que é …..
 
 
Aviso à navegação: este texto não é uma indireta, não é uma direta, não é nada mais que um texto escrito no final de um dia muito complicado por alguém que hoje em dia apenas precisa de ….. escrever ….. e que algumas vezes não lhe apetece não deixar de publicar algo do muito que escreve ou que lhe passa pela alma


sábado, 11 de janeiro de 2014

Devedor-Heroi vs Cumpridor-Otário

 
Os últimos dias de 2013 trouxeram de volta às contas do país 1.253 milhões de €uros. Este valor não veio das prometidas reformas estruturais que em Portugal são apenas uma frase de campanha, não veio de uma qualquer privatização (de uma empresa com lucros), nem mesmo veio de qualquer uma das tradicionais formas de chegarmos a estes números grandes. Estes valores que já deviam estar nas contas do estado há muito, foram obtidos fruto de mais um vergonhoso regime de regularização de dívidas fiscais e à segurança social (RERD).
 
Tal como aconteceu em 1996 com o famoso Plano Mateus e em 2002 sob a égide da Manuela Ferreira Leite, em 2012 com os seus “parcos” 258 milhões arrecadados, 2013 viu nascer mais um famigerado programa de perdão fiscal. E com o privilégio dos prevaricadores se tornarem-se os heróis do orçamento ao permitir ajudar no cumprimento do défice de 5,5%. Este valor, que não corresponde á totalidade do valor devido, representa a módica quantia de 0,7% do nosso PIB. Um valor recorde que evidência bem a deterioração da nossa economia, a inoperância dos mecanismos de fiscalização e o descrédito da nossa justiça.
 
Mais uma vez quem honrou os seus compromissos com a sociedade, às vezes gerando problemas graves de tesouraria e por conseguinte com impacto no seu negócio, vê agora os devedores serem aclamados de heróis, e o seu contributo ser enaltecido por uma corja de políticos sedentos de louros. Quem honrou os seus compromissos foi portanto otário pois poderia ter aplicado esse dinheiro numa qualquer instituição bancária retirando daí os devidos juros, e ainda favorecendo a economia porque disponibilizava fundos aos bancos para estes poderem ajudar outras empresas, e, quando naturalmente aparecesse outro período de perdão fiscal, pagaria a sua divida, correndo o único risco de poder ser agraciado com uma medalha pelo Presidente da República por serviços à pátria.

Para cúmulo dos cúmulos, o Paulo Núncio como qualquer político de 5ª categoria e desejo de fama tem vindo a enaltecer estes números e o programa per si. Como qualquer político o importante é a propaganda pessoal do que consegue obter. Acredito que ele tenha uns dias muito mais alegres, pois deve adorar levantar-se de manhã e olhar-se ao espelho ….. e até deve imaginar já com o seu fato posto antes de sair de casa onde é que também a ele o PR colocaria a medalha de mérito. Se vergonha tivesse, apresentava os números discretamente e calava-se, ou ia pensar como pode garantir que a dívida por receber não atingia estes números, mas aí deixava de ser um político e podia ser visto como competente, o que para ele certamente será um crime de lesa a pátria.
 
Desde que o programa foi lançado até ao seu términos distaram apenas 3 curtos meses, nos quais, 319 mil contribuintes souberam que podiam ter acesso ao perdão, reunirão o capital necessário e pagaram. Apenas para deixar bem claro ….. 3 meses desde o anuncio ao fim do programa ….. 1.253.025.037 €uros reunidos e pagos em 3 meses. A imponência dos números é expressiva ….. foi o que aconteceu.
 
Temos um estado que não cumpre os seus compromissos de pagamento, tanto diretamente como nas empresas da sua esfera mas que, em contrapartida, exige o pagamento do IVA a tempo e horas. Mas á luz do que tem sido a regra, o próprio estado está a passar a mensagem que também o contribuinte pode fazer o mesmo que este faz. Ou seja, não precisa de pagar os seus impostos pois um dia destes quando esta dívida acumulada já for muito elevada e isso se repercutir nas contas públicas pela sua incapacidade governativa, haverá certamente um novo perdão fiscal.
 
Qual é portanto hoje em dia a motivação para o comum cidadão/empresa respeitar o pagamento de impostos devido?
 

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Bons exemplos


Portugal para além da bandeira tem alguns símbolos pelos quais é conhecido. Ainda não dista muito o tempo em que tínhamos o Eusébio e a Amália, sendo que dada a morte desta última reside apenas o fado que a tornou famosa. Fado esse que é também sinónimo e estigma de um povo, que sucumbe ao negativismo do seu triste fado. E estes são os nossos maiores símbolos além fronteiras ….. o futebol e o fado.
 
O povo Português porém anda muito distante do seu país. Após um período de descolonização, seguiu-se um êxodo para o estrangeiro, o que nos fez entrar num período de vergonha nacional. Em relação ao primeiro é fácil perceber, porém, em relação ao segundo é difícil compreender. Éramos um povo atrasado em termos educacionais em relação ao resto da Europa, pelo que naturalmente os nossos emigrantes apenas poderiam aspirar a empregos de baixa qualificação. Era natural, tal como assim acontece agora com os imigrantes oriundos dos países de leste, Brazil e países africanos. É a lei natural da qualificação e da empregabilidade. Mas nunca perdoámos isso aos Portugueses que embarcaram nessa aventura, como se eles fossem culpados do que era Portugal nessa época.
 
Durante muito tempo Portugal quis o dinheiro dos seus emigrantes, mas abominou-os por vários motivos ….. lá fora eram trabalhadores de baixa qualificação e cá dentro eram novos ricos que despertavam a inveja alheia, outra característica marcante do nosso povo. Temos dificuldade em aceitar quem tem sucesso, especialmente se é fruto do seu trabalho. E os nossos emigrantes acabaram por sofrer dentro e fora do seu país. Não me recordo de nenhum Presidente que tenha pedido desculpas por essa nossa postura.
 
Fruto de uma onda surgida nesse período, esteja ou não isso interligado, criou-se uma adversão ao que era Português. Com a abertura à Europa e ao acesso aos produtos que anteriormente apenas tínhamos por via dos emigrantes, gerou-se a fase “o que não é Nacional é que é bom”. Nada do que era Português era bom e isso infelizmente generalizou-se. Contrariamente a muitos países que adotaram medidas protecionistas aos seus interesses de forma a mais rapidamente melhorarem a sua qualidade, o que gerou uma cultura de valorização do que é seu, em Portugal assistiu-se ao inverso, o que iremos pagar durante muitas gerações. É verdade que neste momento isto já não é a realidade reinante, porém, o mal está feito e mesmo que se mude, temos um atraso muito grande para recuperar. Voltando à linguagem futebolística, demos meio jogo de avanço e agora a tática tem de ser muito mais agressiva.
 
Quando as mentalidades começaram a mudar, foi preciso o futebol para produzir a disrupção que faltava. E o mais impressionante é que foi necessário um Brazileiro para nos abrir os olhos. Se hoje estamos mais próximos do nosso país e os nossos filhos sabem cantar “A Portuguesa”, o nosso Hino Nacional, devemo-lo ao Luis Filipe Scolari. Goste-se ou não, essa é a verdade. Foi o então selecionador no Euro 2004 que o conseguiu. Honra lhe seja feita. A ele o meu obrigado.
 
Hoje apareceram notícias que davam como eminente a condecoração do Cristiano Ronaldo pelo Presidente da República. Inteiramente de acordo. E estou não apenas pela notoriedade que ele proporciona ao nosso país, parco de grandes nomes no desporto e tem um logo no desporto rei, mas acima de tudo pelas características tão pouco Portuguesas que o mesmo possui. É um exemplo e honestamente gostaria que fosse mais utilizado como exemplo que é, assim como fossem enfatizadas as características que o levaram a chegar onde chegou.
 
Estamos perante um miúdo que tal como muitos sempre quis ser jogador de futebol. Até aqui nada de novo, porém, desde muito cedo que a sua vontade de ser o melhor não se ficou apenas pela garganta, característica típica de muitos povos que não apenas o nosso. Desde muito cedo que ele interiorizou o que era o seu sonho e efetivamente lutou por ele. E quando o conseguiu, não ficou a “viver á sombra dos seus louros”, continuo sempre a querer sempre ser melhor, e isso é indiscutivelmente algo que deve ser apreciado, valorizado e enfatizado aos nossos filhos ….. querer sempre ser melhor e fazer por isso.
 
Em termos de profissionalismo, num mundo de facilitismo e de vedetas, ainda hoje é dos primeiros a chegar aos treinos, dos mais aplicados durante o seu decorrer e dos últimos a sair. E ao contrário do típico Português, não é o último porque ficou à espera da hora da saída para começar a trabalhar para se mostrar ao chefe ….. não ….. é dos últimos a sair porque continua a tentar melhorar a sua técnica. Isto é de louvar e referir várias vezes para que sirva de exemplo. Valorize-se essa característica.
 
Se as notícias que hoje apareceram forem verdade, não só é mais que merecido, como deveríamos aproveitar para valorizar o que ele é dentro de portas. Mais do que ele representa para a nossa imagem externa, o exemplo que ele pode ser internamente.
 
Parabéns ao Cristiano Ronaldo e muitos sucessos pessoais e coletivos, especialmente os que envolvem a seleção nacional que a bandeira que ele tem ao peito é um símbolo de todos nós. E nós precisamos de acreditar mais em nós.