Das boas memórias que retenho da minha infância, muitas estão relacionadas com a minha avó materna. A minha avó Paulina. Ao escrever estas linhas tomo a consciência que nada falei dela até ao momento neste blog. Talvez seja por querer reter essas boas lembranças apenas para mim ….. talvez para não me expor demasiado, se é que isso é possível depois de tudo o que já aqui escrevi ou o propósito inicial deste blog ….. enfim ….. adiante ….. da minha infância retenho centenas de histórias contadas, algumas esquecidas no subconsciente até um determinado momento ou acontecimento ….. este é um desses momentos ….. esta é uma dessas histórias.
A história que vou contar é sobre um frade Franciscano, se calhar até com mais impacto pelo Papa que temos ….. mas é apenas uma história que acontecimentos recentes me trouxeram à memória. Como não me lembro do nome do frade, apenas me irei referir a ele como frade ….. o tempo apaga várias coisas, nomeadamente alguns pormenores …..
“Havia um Frade que era reconhecido pela sua bondade. Não havia naqueles tempos ninguém que fosse reconhecidamente mais humanitário na terra. Todos os mendigos das várias aldeias em redor tinham roupa arranjada por eles, comiam das graças que ele conseguia e não havia nada que tivesse ao alcance dele que ele não fizesse me prol dos outros ….. um episódio que se passou mostrava a abnegação que tinha. Certo dia, encontrando um moribundo no vão de uma escada para os seus últimos momentos, o Frade decidiu dar-lhe todo o conforto que poderia proporcionar, perguntando-lhe mesmo se tinha algum último desejo que gostasse de ver cumprido. O moribundo que presumo que tenha tido uma vida faustosa, apenas pediu ao frade um último pedaço de presunto ….. apenas isso.
O Frade percorreu a vila de porta em porta pedindo ajuda para cumprir esse último desejo, não tendo porém encontrado ninguém que o pudesse ou quisesse satisfazer. Ao voltar para junto do moribundo, triste e desolado, passou por um quintal onde estava uma pequena vara de porcos. Agindo mais rápido que o pensamento, sacou da sua faca e cortou a perna ao primeiro porco que apanhou. Dada a sua humanidade, não o matou, apenas extraiu o que precisava, a sua perna. E correu a toda a velocidade para junto do moribundo, rezando para ainda o encontrar nesta vida. E conseguiu. Ao servir aquele pequeno pedaço de carne ao moribundo, recebeu um singelo obrigado e nesse mesmo instante, aquela alma partiu com um sorriso nos lábios.
Como na vida nada é eterno, eventualmente acabou por chegar o dia em que o Frade também ele recebeu o chamamento divino. E também ele partiu com um sorriso nos lábios. Chegado às portas de S. Pedro, ele sabia que as suas ações terrestres seriam julgadas, mas ele tinha plena consciência de todo o bem que havia feito. E foi com naturalidade que na balança entre o bem e o mal, viu os pratos penderem para o lado do bem. Ele eram roupas, comida, bebida, valor, etc, etc, etc. Passado algum tempo e uma enorme pilha, a balança tocava com o prato do bem completamente no chão, o que o deixou com um enorme sorriso, satisfeito por todo o bem que havia praticado, porém, sem que nada o pudesse prever, o outro prato começou a ganhar peso ….. e peso ….. e peso ….. até que ambos ficaram completamente equilibrados. O Frade estava em choque. Que mal poderia ele ter praticado para se sobrepor a toda uma vida de bem?
Quando ambos os pratos da balança pararam de se mexer, o Frade olhou para o prato do mal ….. e toda a sua expressão mudou ….. no fundo do prato estava apenas uma única coisa ….. um pequeno bacaro que se esvaia numa poça de sangue e a quem tinha sido cortada uma perna ….. e o veredicto foi breve e bruto ….. as portas do céu estavam vedadas ao Frade.”
Às vezes todo o bem que fazemos é consumido por um momento de desnorte ….. o juízo da balança é medido não pelo tamanho de cada um dos pratos, mas pelos olhos de quem os avalia …..
sejam esses olhos os nossos ou de outros.
PS – Tal como o nome do Frade, vários pequenos pormenores da história são já invenção minha para completar eventuais lacunas de memória, mas o sentido da história mantém-se inalterado. É o que é.